Um
assunto muito polêmico e que muitos deficientes físicos não gostam
de falar é sobre a morte, a perda de quem o ajuda nos seus afazeres
diários, como familiares e cuidadores.
Recentemente
o adolescente Yan Cheng, que possuía paralisia cerebral, veio a
óbito por que seu pai foi colocado em quarentena em consequência da
epidemia do coronavírus, dessa forma o jovem ficou sozinho em casa e
de acordo com as notícias, o pai do jovem pediu ajuda a seus
familiares e autoridades locais e mesmo assim os cuidados não foram
suficientes para manter a vida do garoto. Yan Cheng era um menino
totalmente dependente, que não falava, não caminhava, não comia
sozinho e precisava de seu pai 24 horas no dia para sobreviver, assim
como muitas outras pessoas que possuem algum tipo de deficiência.
Há
muito tempo venho refletindo sobre isso: quem cuidará de mim depois
que a minha mãe morrer? já que eu sou totalmente dependente dela
para realizar as necessidades básicas e os afazeres diários desde o
momento em que acordo até quando vou dormir.
Muitas
das vezes na qual joguei na mega-sena foi na esperança de poder
ganhar esse prêmio milionário e tirar esse fardo de quem cuida de
mim, da pessoa que eu amo, assim, com todo esse dinheiro conseguiria
pagar profissionais para manter a minha qualidade de vida e não
dependeria de ninguém, mas não tenho sorte com jogos e a angústia
continua.
Depois
que minha mãe falecer ficarei aos cuidados de algum parente ou
ficarei na mão do Estado?
Não
gostaria de ficar com parentes, pois os mesmos já possuem um estilo
de vida, com um ritmo e suas próprias responsabilidades, por isso
não quero interferir, ou até mesmo estragar essa rotina. Ressalto
também que conheço casos de perto onde o deficiente físico foi
para casa de um familiar e com isso o inferno só começou, e por
isso a família decidiu que seria melhor colocar a pessoa em um
asilo/abrigo.
Infelizmente
é uma triste realidade a que vivemos, porém vale ressaltar que essa
não é só a realidade dos portadores de algum tipo de deficiência,
mas sim de todos aqueles que dependem da ajuda de alguém para
sobreviver.
Exemplo
claro é um casal de idosos, que viveram felizes por muitos anos,
constituíram família, proveram uma boa qualidade de vida para seus
filhos, mas que em um belo dia o senhor da família vem a óbito, e
uma das filhas, sensibilizada levou a mãe para sua casa, porém,
como o genro começou a ficar incomodado depois de alguns meses,
devido à mudança necessária nos hábitos e na rotina para
recebe-la a mãe decide ir para a casa de sua segunda filha, mas a
história se repete. Já o terceiro filho, um sonhador, que está em
outro pais, trabalhando e batalhando para manter sua vida apesar de
todo o amor que sente pela mãe não consegue ajudar muito, por isso,
todos chegam à conclusão de que é melhor a mãe ter seu canto em
um asilo, ou como muitas pessoas chamam, uma casa de repouso, pois
devido sua idade ela já não é mais capaz de morar sozinha,
precisando de cuidados constantes para sobreviver.
É
importante destacar, que em momento algum os filhos foram ausentes na
vida dessa mãe, pois sempre a visitam quando possível, além de lhe
darem a devida atenção sempre que necessário.
Diante
desta situação é possível imaginar como fica a cabeça dessa
senhora sabendo que o marido morreu e que terá que ir para casa dos
filhos, mudando drasticamente todo seu estilo de vida, pois terá que
se adaptar à todas as regras da casa e é visível essa dificuldade,
tendo em vista que a mesma já está cansada para ter que aprender
novas regras de convivência.
Um
dos hábitos dessa senhora é que ela gostava de tudo organizado, de
todos os objetos nos lugares, vivia em um lugar calmo e tranquilo,
gostava de entrar em sua casa e sentir seu tapete nos pés, sentava
em sua poltrona virada para a janela e colocava sempre uma música
calma no aparelho de som, e ficava ali por horas apreciando o seu
momento, logo seu marido chegava e ela se levantava para fazer seus
afazeres, e mesmo assim a felicidade estava estampada em seu rosto,
pois naquele recinto ela sentia a segurança, o calor e o amor, mas
com um golpe do ceifador tudo se desmoronou e os dias já não eram
mais os mesmos, cada minuto era uma tortura, toda a paz e a
tranquilidade que possuía hoje alimenta uma grande tristeza.
Apesar
da casa de repouso ser uma boa opção para ela já que seus filhos
não possuíam condições financeiras de pagar um asilo mais
confortável, ela ainda era infeliz, pois ali não era seu lar.
Outro
exemplo é o de uma mãe que teve dois filhos, sendo um deficiente
físico que dependia exclusivamente dela para sobreviver. O irmão
“normal”, cresceu, se formou e constituiu uma linda família. E a
mãe dedicou seu tempo totalmente para cuidar do irmão que mais
necessitava de cuidados, no entanto, infelizmente, como não cuidava
de sua saúde a mesma veio a óbito devido a uma pneumonia mal
cuidada.
Ressalta-se
que o deficiente físico apesar de suas limitações físicas possuía
a cognição perfeita, ou seja, a única coisa que ele não conseguia
era fazer movimentos com o corpo, mas a sua mente era brilhante e
inquieta. Assim, ele conhecia muito bem o seu irmão, conhecia a
família do seu irmão, e com a morte da sua adorável mãe, ele não
sabia o que fazer, pois na cabeça dele, ele já tinha tomado tempo
demais da sua mãe e agora não queria tomar tempo de outras pessoas,
pois sabia que ninguém cuidaria dele como a sua mãe cuidou, afinal
mãe é mãe. Ele também não queria ser o fardo de ninguém, em
síntese não queria que nada mudasse em outro ambiente para que ele
chegasse. Não digo que a nova morada seria ruim, mas ele perderia um
pouco de si, um pouco das suas vontades e da sua personalidade.
Muitas
vezes o psicológico nos afeta, digo por mim que sou cadeirante,
espero que entendam estes exemplos que eu citei não de forma tóxica
e nem de forma egocêntrica, pensem fora da caixa.
Como
citei, dependendo da minha mãe para tudo, sou uma pessoa que não
gosta de dar trabalho para ninguém, não gosto de ficar pedindo
coisas para os outros, uma vez ou outra vai, exemplo é quando minha
mãe viaja e pede para alguém ficar comigo, uma, duas ou três
vezes, com o passar do tempo você sente que está atrapalhando e
isto não é legal.
Frisando
que não quero ser o chato do rolê, ser o antissocial que não gosta
de ninguém, muito pelo contrário aprecio o convívio social, só
não gosto de ser o elefante branco na sala de ninguém.
Beleza,
não vou ficar com parente quando minha mãe morrer, vou confiar no
poder do Estado e deixar-me aos cuidados desta máquina estatal
quebrada. Sei que não morrerei, mas definharei até a morte, todos
sabemos como são os abrigos, infelizmente existem muitas pessoas
para poucos cuidadores nestes locais, não possuímos a atenção
devida, não possuímos os cuidados básicos. Mas o que sempre me
pergunto: será que lá poderei ser o que eu sou hoje? Lá
encontraria o conforto que eu tenho hoje? Entre outras perguntas.
Noticia do jovem deficiente que morreu após pai ser colocado em quarentena na China:
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